A melhor coisa do mundo é que há algo
de revolucionário em cada coração jovem. E se não fosse o espírito
revolucionário da juventude o mundo seria uma sucessão de horas e mais horas em
tediosa repetição da ordem estabelecida. Poderia escrever generosas páginas sobre as grandes revoluções inventadas ou lideradas por mentes jovens.
Temos exemplos na política, nas artes, na ciência, nos esportes, por todo lado.
Em todos os campos que o humano ousou caminhar, sempre houve um desses seres
inquietos de espírito juvenil, dispostos a refazer a trilha. “E Deus viu que
isso era bom”.
E foi assim, de revolução em
revolução que chegamos onde estamos. No Brasil, por exemplo, as revoluções e
insurreições juvenis sempre estiveram presentes nos momentos mais marcantes de
nossa história. Basta olharmos as últimas décadas. Nos anos 60, “Abaixo a
Ditadura”; nos anos 70, “Pela Anistia”; nos anos 80, “Diretas Já”; nos anos 90,
prefiro deixar o “Fora Collor” de lado e citar os protestos contra as
privatizações ao som do famoso “Fora FMI”. Assim foi, seguindo o rumo dessas
passeatas que construímos o país no qual vivemos.
Não podemos negar a largueza dos
passos dados. Avançamos muito nas últimas décadas, temos uma economia estável,
uma classe média com bom poder econômico e boas perspectivas de crescimento
para os próximos anos. Olhando assim, até aparece que chegamos a um bom nível
de bem estar social. Será que os jovens já não tem mais pelo que protestar?
Basta dar dois passos para além da “zona sul” de qualquer grande cidade para
perceber que motivos para protestos não faltam. Nossa educação está em
frangalhos, pessoas dormem na rua e passam fome, a agricultura familiar carece
de incentivos [enquanto o agronegócio expulsa as populações rurais e, sem dó,
devasta a natureza], bilhões evaporam pela corrupção, pela burocracia e pelo
espírito faraônico de certos governantes que acham lindo a gente sediar uma
Copa do Mundo FIFA mesmo sem ainda ter resolvido problemas primários como o saneamento
básico.
Há inúmeros motivos justos para
protestar. Mas sinto que a alma protestante de nossos jovens perdeu duas coisas
fundamentais entre uma passeata e outra: senso de justiça e coragem.
Achei fantástica toda aquela história
de “Primavera Árabe”, os protestos organizados pelo Facebook, a juventude de
classe média clamando por democracia (será?) e tal. Ali temos uma causa justa,
original e defendida com coragem pelos árabes, afinal a maioria deles está
disposta a sangrar em favor das pelejas que assumem. O que me espantou foi o
reflexo disso no Ocidente. Não sei se por inveja, por tédio ou pela contaminação
osmótica a qual todos nós usuários de redes sociais somos acometidos, passamos
a querer protestar também. Mas qual é a nossa causa?
Desde os “salteadores” do BBM em
Londres (indignados com a falta de emprego e tarados por bolsas Louis Vuitton),
até os pacíficos ocupantes de Wall Street ou da Cinelândia, o que se vê é um
inventário de reinvindicações tão extenso quanto desconexo. Olhemos para o
nosso umbigo e vejamos nossos protestos: protesta-se contra o capitalismo e o
FMI, pela diminuição dos impostos sobre importados (quero meu Ipad 3 mais
barato!), contra Belo Monte, contra a desigualdade social, contra as UPPs.
Pausa para uma Coca-Cola "zero" entre um protesto e outro.
Continuando, contra Ricardo Teixeira, a favor a eutanásia e do abroto, pela
descriminalização da maconha, pelos direitos dos homossexuais... Ufa,
tantas causas. Mas na primeira chuva, a maioria dos protestantes desaparece
como pó. Ocupação de fim de semana? É nessa hora que os árabes riem alto de
nós.
Antes de terminar, algumas perguntas.
Nossas causas são justas? Conhecemos, a fundo, todas essas
bandeiras pelas quais nos reunimos e lutamos? Estou protestando do jeito certo
(vou a Brasília, finco um monte de vassouras, em seguida, vou embora)? Amo a
causa pela qual estou lutando? Será que estou aqui porque é muito maneiro armar
uma barraca no centro da cidade, me juntar a um monte de amigos para tocar
violão à noite de dormir de dia? Qual é a minha causa?
Respostas? Nenhuma. Mas não custa
ouvir a voz de um poeta morto: "(…)sabes como é difícil sofrer tudo isso,
amontoar tudo isso num só peito de homem… sem que ele estale". Drummond,
que protestava em silêncio, escrevendo e sendo boa gente.
De
longe, vejo nossas causas misturadas, liquidificadas (ave Bauman!). Os
protestos perdem a forma, consistência, se esparramam, escorrem entre nossos
dedos, deixando de ser palpáveis ate se tornarem ótimos vídeos no You
Tube.