quinta-feira, 19 de maio de 2011

QUANDO POSSÍVEL

Por esses dias tenho pensado muito numa improvisada exposição literária que vi, ano passado, em Paris. Acho que é por saudades de lá. Tratava-se de uma coletânea de fragmentos, escritos à mão em cartolinas toscas e dispostos, sem muita ordem, numa grade da Rue de Vaugirard. Eram centenas de pequenos textos, que pareciam ter sido colhidos aleatoriamente entre as obras mais notáveis da literatura universal. Víamos ali Dostoievski , Poe, Verne, Huxley, Kipling, Saramago, e até o nosso Drummond. Todos devidamente traduzidos para o francês, talvez pelo anônimo autor da estranha letra que constava nos “cartões literários”. 

Em meio a tantos nomes conhecidos e textos consagrados, um pequeno poema, de um autor estranho, me marcou para toda vida. Estava num canto, espremido entre um poema de Petrarca e um recorte de Bernanos, um pequeno poema intitulado “Autant que Possible”, atribuído a um certo Constantin Cavafy [também grafado, Konstatínos Kavafís], que mais tarde descobri ser um grande poeta grego, outro daqueles que não nos são permitidos conhecer, por falta de tradução. 

Compartilho aqui, uma foto do Autant que Possible e a tradução livre que fiz para divulgação.

clique na imagem para ver em tamanho original


QUANDO POSSÍVEL

Se não lhe é possível viver como você gostaria
cuide, pelo menos, de não reduzir sua vida
ao excessivo contato com as pessoas
multiplicando gestos e palavras.

Não banalize a vida, indo de um lado para outro,
expondo-se à estupidez das relações humanas
no cotidiano das multidões, para que ela (sua vida)
não se transforme em uma inconveniente estranha.

[Constantin Cavafy, 1863-1933]

***

Às vezes caminho pela Rua das Laranjeiras, na esperança de achar algo semelhante. Até hoje, nada. Acho que é só saudade de Paris.