
Já houve um tempo em que cinema era coisa séria. Fazer um filme significava a tentativa de explorar os limites da imagem, do texto e do contexto, instigando os expectadores à reflexão sobre a arte cinematográfica e não apenas sobre o filme em questão. Hoje em dia faz-se cinema de qualquer coisa, de forma que a produção do filme, banalizada tanto em quantidade como em qualidade, tornou-se mais importante do que a própria arte cinematográfica. Há tantos filmes, e tão pouco conteúdo. O que mais me irrita são aqueles filmes que tentam se aproximar da realidade a tal ponto que, até mesmo a ultrapassá-la.
Isso me remete a uma a uma antiga aula de artes, onde o professor contou a seguinte história: certa vez, tendo o pintor Henri Matisse pintado uma “mulher azul” (vide ilustração do post), um famoso crítico de arte o alertou para a impossibilidade de haver uma “mulher azul”, no que Matisse lhe respondeu, “Mas isso não é uma mulher é um quadro”. A arte não tem, nem deve ter compromisso com o real. A verdadeira arte deve nos ensinar a ver a realidade de uma outra forma, para além da imagem cotidiana.
Sempre que entro em um me lembro dessa passagem antológica de Gabriel Garcia Márquez, no insólito “Cem anos de solidão”:
"DESLUMBRADO com tantas e tão maravilhosas invenções, o povo de Macondo não sabia por onde começar a se espantar. (...) Indignaram-se com as imagens vivas que o próspero comerciante Sr. Bruno Crespi projetava no teatro de bilheterias que imitavam bocas de leão, porque um personagem morto e enterrado num filme, e por cuja desgraça haviam derramado lágrimas de tristeza, reapareceu vivo e transformado em árabe no filme seguinte. O público, que pagava dois centavos para partilhar das vicissitudes dos personagens, não pôde suportar aquele logro inaudito e quebrou as poltronas. O alcaide, por insistência do Sr. Bruno Crespi, explicou num decreto que o cinema era uma máquina de ilusão que não merecia os arroubos passionais do público. Diante da desalentadora explicação, muitos acharam que tinham sido vítimas de um novo e aparatoso negócio de cigano, de modo que optaram por não voltar ao cinema, considerando que já tinham o suficiente com os seus próprios sofrimentos para chorar por infelicidades fingidas de seres imaginários".
Ir ao cinema é mais do que ver um filme, é admirar um milagre da técnica, é caminhar sobre a tênue linha que separa o real do fictício, o táctil do insondável. O povo de macondo esperava do cinema realidade. Teve de quebrar as poltronas.
Não sou como o povo de Macondo. Não vou ao cinema para ver o real. Quero ver no cinema aquilo que a realidade não oferece gratuitamente aos meus sentidos. Quero que a arte, ajude a abrir as portas da minha percepção.
Sempre que entro em um me lembro dessa passagem antológica de Gabriel Garcia Márquez, no insólito “Cem anos de solidão”:
"DESLUMBRADO com tantas e tão maravilhosas invenções, o povo de Macondo não sabia por onde começar a se espantar. (...) Indignaram-se com as imagens vivas que o próspero comerciante Sr. Bruno Crespi projetava no teatro de bilheterias que imitavam bocas de leão, porque um personagem morto e enterrado num filme, e por cuja desgraça haviam derramado lágrimas de tristeza, reapareceu vivo e transformado em árabe no filme seguinte. O público, que pagava dois centavos para partilhar das vicissitudes dos personagens, não pôde suportar aquele logro inaudito e quebrou as poltronas. O alcaide, por insistência do Sr. Bruno Crespi, explicou num decreto que o cinema era uma máquina de ilusão que não merecia os arroubos passionais do público. Diante da desalentadora explicação, muitos acharam que tinham sido vítimas de um novo e aparatoso negócio de cigano, de modo que optaram por não voltar ao cinema, considerando que já tinham o suficiente com os seus próprios sofrimentos para chorar por infelicidades fingidas de seres imaginários".
Ir ao cinema é mais do que ver um filme, é admirar um milagre da técnica, é caminhar sobre a tênue linha que separa o real do fictício, o táctil do insondável. O povo de macondo esperava do cinema realidade. Teve de quebrar as poltronas.
Não sou como o povo de Macondo. Não vou ao cinema para ver o real. Quero ver no cinema aquilo que a realidade não oferece gratuitamente aos meus sentidos. Quero que a arte, ajude a abrir as portas da minha percepção.
pax tecum amicis...