Como permanecer criativo
num mundo onde é tão fácil copiar, recortar e colar? Outro dia coloquei esta questão
para o grupo de professores que coordeno. Pelo silêncio inicial pude perceber
que a resposta estava longe de ser fácil. Porém, maravilhoso é o tempo em que
vivemos. Um professor sacou da bolsa o seu Ipad e digitou minha pergunta no
Google [este incrível oráculo pós-moderno] e logo em seguida milhares de
respostas estavam à nossa disposição. Por ironia, caímos na nossa própria armadilha.
Sem saber como poderíamos ser criativos, naquele momento, recorremos à
criatividade alheia. Dente os incontáveis resultados, um vídeo chamou a atenção
de todos 29 ways to stay creative [aqui]. Simples,
conciso e didático. Genial. Era tudo que precisávamos.
Vimos o vídeo e pensamos, “ok, é muito bom”, mas não era
nosso. Precisámos descobrir nossas próprias maneiras de permanecer criativos.
Alguém sugeriu, “cada um de nós deve elencar numa folha pelo menos 10 maneiras
que utiliza ou pretende utilizar para seguir criativo”. Batata! Em alguns
minutos apareceram as listas mais mirabolantes deste lado da galáxia. Não posso
divulgar listas alheias, por isso coloco aqui a minha, que não é lá “grandes
coisas”, mas é minha e me ajuda. Torço que ela inspire mais alguém a, pelo
menos, montar sua própria lista de inspirações criativas.
10 maneiras para permanecer
criativo
1. Plante. Dos exercícios manuais possíveis a uma
pessoa totalmente inabilidosa, como eu, plantar é o que mais gosto. É preciso
preparar a terra, conhecer a semente, sujar as mãos, regar, oferecer luz,
esperar crescer... todo este processo é um bom exercício de paciência. E é bom
ter paciência, porque criatividade não é uma virtude que se nasce com ela ou
aparece em nós da noite para o dia. Acho que nossa criatividade, neste caso,
cresce junto com a planta, conforme a gente cuida dela.
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Intervenção "Máximo Silêncio", Praça Paris, Rio. |
2. Aprenda novos idiomas. O conhecimento de outra língua traz
consigo um novo e larguíssimo horizonte. A língua não vem sozinha, junto a ela
vem toda uma cultura com a qual se pode aprender e também toda uma nova
população com quem se pode conviver e partilhar.
3. Leia quanta literatura
puder.
Ler é o melhor exercício de imaginação possível, as letras tem o poder de nos
transportar para diversas realidades sem a influencia dos sentidos. É pura
imaginação. É incrível imaginar cada uma as cidades criadas por Calvino, cada
membro da família Buendía, da obra de G. G. Marquez ou cada dor sentida pelo desafortunado
Raskólnikov, personagem de Dostoiévski. Ler é imaginar. A imaginação e a
Criatividade são irmãs siamesas.
4. Escreva à mão. Conheço gente que só usa caneta para
assinar. Continuamos escrevendo, mas estamos perdendo o exercício da letra.
Sentir o cheiro da tinta de uma boa e velha Bic no papel dá a sensação de que o
trabalho da escrita está fluindo melhor. Além disso, escrever a próprio punho nos
une há uma tradição milenar de tentar desenhar nossas palavras de maneira
bonita ou pelo menos, inteligível aos outros.
5. Faça exercícios diários. Corra e esvazie a mente. Em “cabeça
cheia” não há espaço para a criatividade, só para a repetição. Pedale e veja
lugares diferentes. Ande e reflita sobre o que vem fazendo no dia-a-dia. Canse
o seu corpo para repousar o intelecto mais profundamente. Cansaço e descanso
são fundamentais no processo criativo. Com o suor eliminamos muita coisa velha
que está em nós. No sono, sonhamos a novidade.
6. Jogue, mas não gaste seu
dinheiro com isso. Cartas,
videogame, xadrez, não interessa qual, toda espécie de jogo exige do jogador a
resolução rápida dos mais variados problemas. Nas cartas, é preciso saber
blefar, calcular, “ler” o outro; no xadrez, escolher a jogada certa entre
milhares possíveis é fundamental; no War, o sucesso depende de delimitar uma
estratégia para conquistar territórios. Jogos são ensaios divertidos da vida.
7. Dê aos pobres algo mais
que roupas e comida.
Muita gente tem o hábito de ajudar àqueles que precisam. A maneira mais comum é
a doação de bens materiais. Ótimo se você faz isso. Mas, doar seus brinquedos
velhos não faz de você uma pessoa criativa. Os pobres não precisam apenas de
roupas e comida. Eles querem alegria, arte e conhecimento tanto quanto
celulares modernos e tênis Nike. Que tal partilhar um pouco do que você sabe
com quem precisa? Dê uma aula em um albergue, leve seu Playstation para jogar
com jovens que nunca jogaram, ensine alguém a construir uma pipa. Você sabe o
que pode fazer pelo outro.
8. Desconecte-se.
9. Beba bons vinhos. Procure conhecer a uva do vinho que bebe,
tente identificar os aromas e sabores, não exagere na dose. Aprender a amar os
vinhos é uma boa maneira de aprender um pouco de geografia, história,
agricultura, arte e nos encaminha para a boa culinária e para uma postura mais
alegre à mesa. Repito, não exagere.
10. Leia os manuais de
instrução. É típico,
mal tiramos da caixa os nossos gadgets e
a primeira coisa que fazemos é ligar. Ler os manuais, as bulas de remédio, as
fórmulas os mapas, as notas de rodapé e tudo que normalmente está em letras
pequenas [por isso saltamos] nos ajuda a tirar melhor proveito das coisas, ajuda
a estabelecer novos links de pensamento e de uso. As letras pequenas nos
ensinam a olhar mais longe.
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Uma última me veio à cabeça de depois de tudo escrito. Ame mais. Porque São Vicente de Paulo
dizia que “o amor é criativo até o infinito”. Concordo.